20 anos da internet, 200 milhões de blogs no mundo e surge o Trabalhador da Notícia

De acordo o estudo feito pela empresa de análise de tráfego online Sysomos, o Brasil é 4º país do mundo em número de blogueiros. Além disso, pessoas entre 21 e 35 anos são as que mais utilizam os blogs e mais de 50% são mulheres.

O jornalista, radialista e vice-presidente da Associação Bahiana de Imprensa Ernesto Marques resistiu até o último minuto, mas este ano passou a fazer parte dessa blogosfera.  O lançamento do seu blog Trabalhador da Notícia ocorreu no dia 7 de abril, o Dia do Jornalista.

O Trabalhador da Notícia disputa atenção no ciberespaço, apostando na qualidade do conteúdo e nos comentários polêmicos sobre temas da atualidade. Confira o bate-papo com Ernesto.

1. No dia de lançamento do seu blog, você publicou a frase ” Neste 7 de abril, o jornalista Ernesto Marques vira blogueiro pra fazer jornalismo”. Quando você decidiu utilizar as novas mídias para fazer jornalismo?

Desde que deixei a assessoria do ex-governador Jaques Wagner em maio de 2011, mergulhei na militância político-partidária e, naturalmente, me distanciei da atividade jornalística. Não considero que sejam coisas incompatíveis, mas ainda vivemos sob o mito da objetividade jornalística que nos impõe uma visão exageradamente romântica da profissão. Os próprios jornalistas cobram dos colegas que decidem atuar como militantes, dentro ou fora de partidos, uma isenção que nunca é cobrada dos nossos patrões – muitos deles no exercício de mandatos, ou visceralmente engajados em governos, parlamentos e campanhas. Decidi colocar em prática essa ideia que já acalentava há algum tempo, mas sem compartilhar essa fantasia da isenção. Então procuro fazer um jornalismo mais de opinião, pelo menos até criar condições para ter reportagem como carro-chefe do blogue. Depois de 9 anos como sindicalista na área de rádio e televisão, depois de uma quase candidatura a vereador e de uma disputa pela presidência estadual do PT, a alternativa das novas mídias era o caminho mais fácil por depender apenas da minha decisão pessoal. Mas quero muito fazer rádio. Até lá, vou dar sangue no blog.

2. O nome do seu blog é Trabalhador da Notícia. Por que escolheu esse nome?

Primeiro, porque nunca viajei naideia que seduz muitos colegas, como se nós não fossemos tão trabalhadores quanto os gráficos, os administrativos das empresas de comunicação, os motoristas das equipes de reportagem, os técnicos, etc. Então é, antes de mais nada, uma declaração de plena consciência de classe. Segundo, em homenagem a um grande jornalista e militante, que foi Perseu Abramo. “Um trabalhador da notícia” foi seu slogan de campanha e é título do livro organizado por sua filha, Bia Abramo, com uma primorosa coletânea de artigos de Perseu. É uma figura que vale a pena conhecer

3. Quais os principais temas abordados em seu blog?

Ernesto Marques

A pauta gira mais em torno de política, daqui de Salvador, da Bahia, mas também nacional. Mas aos poucos temos agregado colaboradores regulares, como o jornalista Eugênio Afonso, que tem produzido textos muito interessantes sobre televisão, cinema e comportamento. mais recentemente, o professor de História, Renato Santos, que foi meu primeiro editor, quando participei da equipe do jornal da escola em que estudei o antigo segundo grau. Além de excelente texto, Renato traz reflexões preciosas sobre questões internacionais, como a xenofobia crescente na Europa e o conflito da Palestina.

4. Quanto tempo você se dedica ao Trabalhador da Notícia?

Depende muito das circunstâncias, já que o blogueiro tem que se virar pra ganhar a vida em outras atividades. Normalmente invisto algumas horas das madrugadas, para não comprometer a agenda do cotidiano e também por ser um período de menos movimentação nas redes sociais, mais silêncio e menos fatores de dispersão. Mas não é suficiente, até porque depois de 3 ou 4 dias abrindo mão de algumas horas de sono, o cansaço se apresenta. Mas escrevo – e leio, obviamente – para o blogue em outros turnos e nos fins de semana.

5.  Este ano a internet completa 20 anos com mais de 200 milhões de blogs no mundo e milhares de grupos de mídia livre espalhados pelo Brasil. Isso significa que a internet democratizou a comunicação?

Acho um exagero dizer que ela democratizou a comunicação, mas é inegável que houve um avanço espetacular. No entanto, não podemos esquecer que a rede é uma “invenção” que já nasceu militarizada, nem podemos desconsiderar que a internet depende de mega-empresas que defendem seus interesses enquanto prestam-nos serviços. A Internet não é uma panaceia, ela traz muitas possibilidades, mas traz riscos também. No entanto, seria um tremendo exagero negar seu efeito democratizante sobre as comunicações e, nesse sentido, considero que o Brasil deu uma grande contribuição ao aprovar o Marco Civil da Internet. Não é coisa para se deixar ao bel sabor do deus mercado.

6. Como você enxerga essa comparação entre regulamentação da mídia e censura?

Não acho razoável falar em qualquer mecanismo de censura. Há muita mistificação sobre a proposta de regulação defendida por um conjunto expressivo de movimentos sociais articulados em torno do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação. O que se propõe é uma regulação econômica, para combater os oligopólios que já são banidos expressamente pela nossa Constituição. A regulação que defendemos não institui qualquer mecanismo de censura, mas propõe a adoção aqui, de regras como a proibição da chamada propriedade cruzada (um mesmo grupo operar empresas de rádio, televisão, impressos…) e outros mecanismos de proteção da sociedade que já existem há décadas nas democracias mais consolidadas do mundo. Mas é só reparar que os artigos da Constituição de 1988 que tratam de comunicação, nunca foram regulamentados por um Congresso Nacional repleto de radiodifusores ou de parlamentares sustentados por empresários da comunicação. É o que eu falei no começo: nós profissionais, costumamos ser rígidos na cobrança da tal isenção, entre nós, enquanto os nossos patrões se organizam para defender seus interesses. Ou seja: se organizam para manter tudo como está. E ai levantam logo, hipocritamente, a acusação de que nossas propostas ameaçam a liberdade de expressão. É um argumento torpe.

7. Existem vários blogueiros que sofrem perseguições políticas ou não tem apoio financeiro para se manterem. É seu caso?

Não tenho razões para reclamar de perseguição política por causa do meu trabalho no blogue. Mas não me surpreenderei se tal ocorrer, porque tenho apetite para temos quentes, como os efeitos nefastos da especulação imobiliária sobre a nossa qualidade de vida (caos no trânsito, alagamentos, deslizamentos de terras) ou a barbárie decorrente desta mesma especulação sobre os moradores do Centro Histórico. Procuro tratar os fatos e fontes com o devido respeito aos preceitos da profissão, mas as vezes é exatamente isso que incomoda. Já comi o pão que o diabo amassou por encarar outras pelejas e já fui duramente perseguido. Enquanto tiver forças, tô na luta, desejando contribuir com o meu trabalho para termos uma sociedade melhor.

8. Jornalista, radialista, vice-presidente da Associação Bahiana de Imprensa e agora blogueiro. Todo blogueiro faz jornalismo?

Não necessariamente, até porque o jornalismo não é a única utilidade da blogosfera. Jornalismo é uma profissão que tem seus códigos, suas técnicas e, portanto, só pode ser feito por quem escolheu a profissão e se preparou técnica e eticamente para isso. Mas produzir conteúdos não é exclusividade de jornalistas, e há blogueiros fazendo um belíssimo trabalho na Internet.

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